quarta-feira, 4 de junho de 2008

Washington promove cenário de conflito na América do Sul

Já faz alguns anos que o governo dos Estados Unidos vem procurando a maneira de promover um conflito entre os países sul-americanos para contrabalançar os esforços, liderados pela Venezuela, de integração latino-americana e a verdadeira independência da parte sul do continente com respeito ao império do norte. Contudo, suas tentativas bélicas não encontraram braços receptivos na região —até poucos meses atrás.

A partir de primeiro de março, quando o governo colombiano realizou uma invasão não autorizada em território equatoriano, massacrando a sangue frio as pessoas presentes no acampamento de Raúl Reyes — que incluía um grupo de estudantes mexicanos — o governo de Álvaro Uribe mostrou sua receptividade à estratégia imperial de Guerra Regional.

A partir desse momento, temos visto incidente após incidente buscando provocar uma reação hostil dos vizinhos da Colômbia. Um dia, soldados colombianos cruzam a fronteira venezuelana; outro dia, mentem sobre fotos ou documentos supostamente obtidos de computadores não autenticados que vinculam o Equador ou a Venezuela com o terrorismo e com a desestabilização. Outro dia, Álvaro Uribe anuncia sua disposição de hospedar a base militar dos EUA — atualmente em Manta, no Equador — em território colombiano, apesar de a Colômbia já manter três bases militares norte-americanas dentro de suas fronteiras, além de múltiplos comandos militares operativos por toda a fronteira com a Venezuela e a costa caribenha. Depois, Uribe reúne-se com o governador do estado venezuelano de Zulia, Manuel Rosales, conhecido opositor às políticas de Chávez, e expressa seu desejo de estreitar as relações entre Zulia e a Colômbia, como se Zulia fosse uma nação diferente da Venezuela, com sua própria política exterior.

Depois, um avião militar norte-americano, o Viking S-3, sai da base dos EUA no aeroporto internacional Hato, em Curaçao, e chega até a ilha de Orchila 'devido a um erro de navegação', coisa que ninguém acredita. Atenção, desta vez aconteceu de detectarem o avião norte-americano realizando suas ações de espionagem, não quer dizer que foi a primeira vez, nem que será a última.

O anúncio do Pentágono da reativação da Quarta Frota da Armada norte-americana é mais uma amostra de que Washington quer trazer sua guerra para a nossa América. Durante dois anos eles têm reforçado e equipado suas bases militares na região, principalmente na zona caribenha —Curaçau, República Dominicana, Colômbia— e estão construindo uma nova no Paraguai, perto da fronteira com a Bolívia e das maiores reservas de água do continente. Não há nenhum outro país no hemisfério que mantenha tanta presença militar em quase todos os países da região. E agora estão aumentando esta presença para garantir uma permanência bélica de Washington nas Américas. Não é possível ver a presença da Quarta Frota —além de todas as suas bases militares na região e da ocupação militar do território colombiano— como algo diferente de uma ameaça à paz regional e à soberania dos nossos povos.

E agora, estão consolidando a estratégia separatista e secessionista na Bolívia, com as consultas separatistas nos departamentos de Beni e Pando, que apesar de ilegais e ilegítimas serão utilizadas, junto com o referendo que ocorreu no dia 4 de maio passado em Santa Cruz, como plataforma para dividir a Bolívia em pedaços. Depois, as forças imperiais tentarão levar estes planos para a Venezuela e o Equador, onde há alguns anos lançaram as sementes separatistas nas zonas de Zulia e Guayaquil. O presidente Chávez denunciou por estes dias que esse plano secessionista está expandindo-se fora de Zulia para incluir também os estados de Táchira, Apure e Mérida, com o objetivo de criar uma espécie de 'meia-lua' venezuelana.

Tudo isto vai ao encontro do Plano Balboa, elaborado no ano 2001 como um exercício militar de invasão à Venezuela e ocupação da região fronteiriça com a Colômbia (que inclui Zulia, Táchira e Apure) e faz parte do plano do estado Falcão para poder controlar a indústria petroleira e proteger o fornecimento de energia para os EUA. Parte da justificativa para a invasão a território venezuelano no Plano Balboa seria garantir a integridade do país vizinho, a Colômbia, e reduzir a influência de um líder rebelde, de esquerda que se associava com "grupos terroristas". Sete anos depois, estamos vendo como Washington foi preparando o cenário para ativar o Plano Balboa na vida real.

O atual encarregado da política de Washington para a América Latina dá a indicação de até que ponto poderia ir esta estratégia de conflito regional. O Sr. John Negroponte, atual Subsecretário de Estado, segundo de Condoleezza Rice, é quem assumiu o papel de reorientar a política dos EUA no hemisfério. No dia 1º de junho, reuniu-se com o presidente colombiano Álvaro Uribe em Medellín, preparando a reunião da Organização de Estados Americanos, realizada nessa cidade de 1º a 3 de junho.

Negroponte também apareceu pouco tempo atrás na sede da OEA em Washington, durante o debate sobre a violação territorial colombiana ao Equador. Apesar de suas pressões e táticas mafiosas não conseguirem uma resolução favorável aos interesses de Washington, conseguiram impedir uma condenação e um rechaço contundente do organismo multilateral à Colômbia.

Negroponte é um homem de guerra. Dirigiu grande parte da guerra suja na América Central durante os anos oitenta, quando era embaixador dos EUA em Honduras. Durante a estada de Negroponte em Honduras, a assistência militar dos EUA a esse país passou de US$ 3,9 milhões para US$ 77,4 milhões por ano. Em 1994, a Comissão Hondurenha para os Direitos Humanos apurou o desaparecimento e tortura de pelo menos 184 opositores políticos. Também acusou especificamente Negroponte por violação dos direitos humanos. Além disso, Negroponte esteve envolvido no financiamento e armamento dos Contra na Nicarágua, cujos membros eram mais conhecidos como esquadrões da morte e assassinos. Foi um dos implicados no caso Irã-Contras, acusado pelo Congresso dos EUA de ter participado na venda de armamento para o Irã para continuar financiando os Contra na Nicarágua.

Anos depois, Negroponte apareceu como Embaixador dos EUA no México, justamente durante o lançamento dos Zapatistas. Dizem que coordenou a participação dos serviços de inteligência norte-americanos na guerra contra os Zapatistas em Chiapas. Seu papel como Embaixador dos EUA nas Nações Unidas foi chave para justificar a guerra preventiva contra o Afeganistão e o Iraque. Posteriormente, foi nomeado Embaixador dos Estados Unidos no Iraque, conseguindo aumentar a capacidade da embaixada norte-americana nesse país e a quantidade de mercenários, como a Blackwater, operando no Iraque com contratos multimilionários com o Departamento de Estado e o Pentágono para prestar 'serviços' de segurança.

Em 2005, foi nomeado Diretor Nacional de Inteligência dos EUA, responsável por toda a comunidade de inteligência, militar e civil, e aumentou em 50% a presença da CIA na América Latina. Também criou a Missão Especial da CIA para Venezuela e Cuba, uma nova entidade que conta com um time de especialistas em inteligência e espionagem dedicado a 'recolher informação de inteligência' e 'preparar e executar estratégias' para contrabalançar a influência da Venezuela no hemisfério e debilitar sua relação com Cuba. Negroponte definiu a Venezuela e o Presidente Chávez como a 'mais grave ameaça aos interesses norte-americanos na região' em fevereiro de 2006. Foi um dos grandes responsáveis pela política hostil de Washington para a Venezuela e seus aliados no hemisfério. A partir de 2007, Negroponte incorporou-se ao Departamento de Estado como o segundo homem mais poderoso da chancelaria norte-americana, e desde então a relação entre a Venezuela e os EUA piorou ainda mais.

A combinação de fatores: Negroponte mais uma vez dirigindo a política imperial neste hemisfério; a Quarta Frota da Armada dos EUA ativada na América Latina; a entrega da Colômbia, por parte do governo de Álvaro Uribe, para as forças militares norte-americanas e sua postura abertamente agressiva com seus vizinhos; o lançamento dos movimentos separatistas na Bolívia, Equador e Venezuela, que buscam dividir e desestabilizar nossos processos de avanço social; e o aumento das bases militares norte-americanas por toda a região, tudo isso indicando que Washington busca ativamente um conflito armado na América Latina. A Venezuela e seus aliados precisam achar a maneira de não cair nas provocações de Washington.

Devemos promover a paz, mas sempre mantendo a preparação necessária para defendê-la.

Diretora-Geral da Fundação Centro de Estudos Estratégicos de Segurança de Estado 'CESE'
reproduzido de: agência Carta Maior - clic sobre o título para acessar.

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